Estava com dezenove anos, precisava trabalhar para pagar
minha escola e de minha irmã. Meus irmãos mais velhos que já trabalhavam e que
vinham pagando nossa escola, disseram que no ano seguinte, não iriam mais
bancar. Vivíamos tempos difíceis. O acesso às escolas
públicas era praticamente impossível. Eu afirmava para minha irmã Helena, que
não precisava se preocupar, eu pagaria a sua escola e a minha no próximo ano.
Eu falava aquilo sem duvidar, ignorando todas as dificuldades.
Não
tinha salário, pois trabalhava para o meu pai, que a esta altura tinha um
depósito de pão no bairro onde vivíamos.
Procurando
serviço... Era setembro de 1978. Adentrando no serviço de água da cidade – o
SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto, meus olhos saltaram de alegria. Que
lugar lindo! Desejei ardentemente trabalhar naquele local. Era uma autarquia
municipal, eu não tinha noção do que eu precisava fazer para trabalhar ali. Era
um prédio moderno, com um jardim delicadamente cuidado. Árvores podadas em
formato arredondadas e um lindo e grande pé de flamboyant, a árvore mais linda
que já vi até hoje. O chão estava repleto de flores vermelhas - as flores do flamboyant,
dando-me as boas-vindas...
SAAE - Imagem retirada do Facebook |
Mas precisava fazer concurso público. Eu era inexperiente. Já havia feito alguns
testes em alguns lugares, mas nada como um concurso público.
Pedindo informações, disseram-me que até
aquele momento não tinham previsão de quando seria o próximo concurso...
Mas, incrivelmente, depois daquele desejo
ardente... não é que abriram vagas e dentro de dois meses, estava tudo certo.
Passei no meu primeiro concurso público.
Era novembro
de 1978. Eu precisava urgente começar a trabalhar, para no próximo ano fazer
minha matrícula e de minha irmã na escola, como havia prometido. Também já não
queria estudar naquele colégio onde estudava. Queria passar para uma escola
melhor. Eu sonhava estudar no Clóvis Salgado, uma escola pequena, mas muito
aconchegante, era como uma família. Tinha um belo time de vôlei feminino, com
jogadoras reconhecidas na cidade. Era época dos famosos jogos estudantis, torneios
que movimentavam a juventude Valadarense...
Retirada do facebook - Vista interna Clovis Salgado |
Mas
eles não me chamavam. Minha mãe se desesperava. Meu Deus! Como vocês vão
estudar? Eu afirmava, desconhecendo como funcionava as instituições... Vou
começar trabalhar mãe, e vou pagar para mim e para a Helena. Pode ficar
tranquila. Já passei no concurso. E falava aquilo com convicção e segurança...
Toda
semana ligava para o departamento de
pessoal, cobrando minha vaga. - “Aqui, e a minha vaga?!...”
Passei
em 5º lugar e precisavam de sete pessoas, de acordo com o edital.
-“Eu
estou precisando de trabalhar, para pagar minha escola e da minha irmã”,
insistia... E isto se repetia em todas as semanas subsequentes...
Depois
de já estar trabalhando ali no Setor de pessoal algum tempo, minha colega,
confessou-me sorrindo, algo que me surpreendeu. Ela disse: Cida, o senhor Xxxx, (o chefe administrativo), pediu para arrumar uma vaga para você de
qualquer jeito, porque você era muito chatinha, ligava toda semana cobrando sua
vaga, acrescentando, que eu não os deixava em paz...
Uaw! E eu pensava que tinha direito à minha
vaga!... Sorri!
Descobri
mais tarde, que várias pessoas eram contratadas sem terem prestado concursos,
eram conhecidas do diretor...
As
aulas começariam em março, por causa das férias prolongadas e do carnaval.
Em 31
de janeiro de 1979, iniciava em meu primeiro trabalho, concursada.
Inexperiente,
sem saber como era trabalhar fora do ambiente familiar... Cheguei humilde, tímida, mas muito feliz
pela grande conquista!
Trabalhei nos melhores setores,
primeiro no Departamento de Pessoal, por dois anos e os outros quatro anos no
Departamento de contabilidade. Aprendi muito. Fiz amizades verdadeiras.
Muitas
meninas que já trabalhavam ali antes de mim, perguntavam-me: Como você
conseguiu iniciar nesse Setor ( Departamento de Pessoal)?!... Você já conhecia alguém para te dar
essa função?!... A gente já está aqui há tanto tempo e nunca tivemos
oportunidades!... Elas trabalhavam no Setor de Arrecadação. Não era pior do que
o meu, não!...
Era somente o
primeiro lugar onde se iniciavam, dali algumas saíam para outros setores mais
especializados e que davam mais experiências.... Todas, com mais tempo de
trabalho, queriam chegar onde eu já estava... E eu era a última contratada.
Não,
eu não conhecia ninguém, para me dar aquela posto. Dentro de mim, eu tinha
certeza que Alguém me via e Se movia em meu favor... Sabe quando você tem um
infinito inteiro em sua volta de amparando?! Assim eu sentia... Este infinito era DEUS!
No
início de março de 1979, recebi o meu primeiro salário. Tive o dinheiro suficiente
para fazer as respectivas matrículas e pagar as mensalidades na Escola Clóvis Salgado,
minha e da Helena. Quatro valores de uma só vez. Sobrou pouco dinheiro para mim naquele mês,
mas estava tão feliz!...
Neste momento, a alegria invade minha alma e sinto
aquela sensação daqueles dias, e vejo o INFINITO me envolver...
Reiniciamos
na escola que queríamos e sem depender de ninguém.
Então
esta foi uma linda experiência. Não conhecia Deus, através da Sua Palavra. Mas O conhecia na simplicidade, no
verdadeiro, na sinceridade, na gratidão e na fé prática... Pois tudo o que fiz,
para conseguir aquele trabalho, foi tomando atitudes e crendo que conseguiria,
em nada duvidando...
Tinha
os bons olhos, cria nas pessoas e em tudo que me apresentavam, sem preconceito,
sem julgamentos. E isto me aproximou do meu Senhor e Ele satisfez os desejos do meu coração.
Não
foi sempre assim. Todas as vezes que me afastei, deixando de ver com os bons
olhos e de ser humilde, nuvens escuras apareceram em meu caminho...
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